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Blog Da Marilia Coutinho


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Fala Galera, compartilhando com vcs um blog muito bom!!!! Marilia Coutinho!

https://mariliacoutinho.livejournal.com/

segue alguns textos dela:

Bodybuilding – esporte marginal

Bodybuilding não é um esporte olímpico. Para alguns, sequer um esporte é. Frederick C. Hartfield discutiu a aceitação do Bodybuilding como esporte olímpico, sugerindo que os preconceitos históricos contra essa atividade vêm sendo paulatinamente superados. Ben Weider, presidente da International Federation of Bodybuilders (IFBB), solicitou a aceitação do BB como esporte olímpico ao presidente do IOC, Lord Killanin, nos início dos anos 70. A resposta foi violentamente negativa (“over my dead body”). Uma década depois disso, a mesma solicitação foi encarada de forma menos negativa por Avery Brundage, então presidente do IOC. Em meados dos anos 80, Juan Antonio Samarach abriu as portas do IOC para o BB. Finalmente, dia 30 de janeiro de 1998, o IOC atribuiu à IFBB o status de “federação reconhecida” e ao BB, o status provisório de esporte reconhecido.

Os argumentos correntes contra o reconhecimento do bodybuilding envolvem duas categorias de preconceitos: o primeiro é ligado ao uso de recursos ergogênicos, particularmente dos esteróides anabolizantes. O segundo diz respeito à natureza não-competitiva da atividade, que tiraria dela o caráter esportivo. O primeiro preconceito ironicamente tem uma relação com a própria marginalidade do esporte: como não é reconhecido como modalidade olímpica, sua prática não é regulamentada e não são aplicados os testes anti-doping que camuflam o uso de bola nos outros esportes (sim, camuflam, quem duvida disso?). O segundo preconceito é tão irracional que consegue ilustrar sem muito disfarce a rejeição a tudo que diz respeito à força em nossa sociedade. Os que defendem esse preconceito acreditam que não existe performance em si no BB: ninguém “executa” uma tarefa qualquer que possa ser medida contra um referencial de desempenho ou adversário contra adversário. De fato: exceto por posar e executar uma coreografia, não há uma ação concorrencial no ato da competição. Quem, no entanto, em sã consciência, consegue defender a idéia de que o BB não é uma atividade de alta performance física? Executada ao longo de meses e anos, cuja única diferença para esportes de ação é que o momento do campeonato não julga a ação, e sim o resultado da performance.

Como muitas atividades rejeitadas pela elite como prática socialmente aceitável para seus pares, o BB tem larga aceitação em certos segmentos da sociedade, particularmente as classes economica e educacionalmente excluídas. Popularizou-se nos Estados Unidos, nos anos 30, quando foi instituido o campeonato Mr. America e a Muscle Beach ganhou a mídia, em Santa Monica. Só décadas mais tarde o esporte alcançou articulação internacional: a International Federation of Bodybuilders foi fundada em 1946 e a National Amateur Bodybuilder’s Association em 1950. Logo apareceram os grandes campeonatos internacionais e o esporte se expandiu para outros países: o Mr. Universe, da NABBA, em 1950, e o Mr. Olympia, da IFBB, em 1965.

Ao mesmo tempo que o esporte se expandia, disseminava-se também o uso indiscriminado dos anabolizantes, estimulado pela competição entre as grandes potências internacionais no contexto da Guerra Fria nos “esportes politicamente corretos” (olímpicos).

Embora o doping seja uma indústria associada a fatores econômicos e políticos de enorme complexidade e presente em praticamente todos os esportes olímpicos, a sua demonização ficou associada ao BB.

Fico pensando se Hartfield estaria certo e estaríamos assistindo uma abertura para o BB no mundo todo. Não há dúvida de que o esporte está crescendo, mas, por enquanto, ainda de forma marginal. Gostaria de pensar que Hartfield tem razão. Acredito que cada prática esportiva de alta performance ocupa o papel de paradigma em algum avanço no controle tecnológico da saúde humana. O BB ocupará seu papel talvez no maior desses avanços: a incorporação e valorização da capacidade funcional força para o bem-estar humano de maneira geral e controle das principais causas de mortalidade e morbidade contemporâneas. No entanto, surgiu uma suspeita sombria na minha cabeça: será que, com essa transformação e apropriação do treinamento de força pelas classes média e alta, os excluidos que hoje têm pelo menos acesso a esse esporte e nele as chances de se expressar, de ter excelência e de gozar de aceitação não serão expulsos de mais esse paraíso?

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Esportes de força: politicamente incorretos?

Esporte é uma prática que diz mais respeito a alta performance do que ao condicionamento físico e saúde. Mesmo assim, alguns esportes são mais frequentemente associados a uma ou outra ponta do espectro. Assim, alguns esportes são, no imaginário público, mais “saudáveis” do que outros. Os esportes “saudáveis” proporcionam o paradigma para a atividade física como fundamento do “estilo de vida saudável”. Tais esportes são predominantemente relacionados com atividade física aeróbica: corrida, natação, ciclismo, volei, etc. Na outra ponta do espectro estão os esportes de força como levantamento de peso e fisiculturismo. Mais ainda do que os chamados “esportes radicais”, os esportes de força são associados a comportamentos ariscados e irresponsáveis, bem como a práticas, nutrição e atitudes mentais pouco saudáveis. Numa época em que a promoção de um estilo de vida saudável, baseado em atividade física e nutrição “saudáveis”, se tornou a prioridade para órgãos inter-governamentais como a Organização Mundial de Saúde, os esportes de força se tornaram não apenas marginais, mas politicamente incorretos. A estigmatização dos esportes de força vai do esporte profissional às práticas amadoras e recreacionais em academias. Alta performance em força ou desenvolvimento muscular é caracterizada como não-natural e não-saudável, enquanto alta performance em velocidade de corrida ou nado representam a expressão positiva da quebra dos limites da realização humana. Corrida, ciclismo ou natação nas ruas ou academias é considerado saudável e racional, enquanto treinamento de força é considerado narcisista e perigoso. Os estereótipos corporais refletem as mesmas polaridades: corpos fortes são associados à violência, pouca capacidade intelectual, baixos níveis educacionais e culturais, enquanto corpos magros pertencem a indivíduos muito mais bem sucedidos e socialmente integrados. Se esta estigmatização deriva de forças sociais que restringem os esportes de força (e o exercício da força) aos estratos socio-culturais mais baixos, ou se a relação causal é inversa, não é claro. Historicamente, o exercício da força foi associado ao trabalho braçal, portanto, aos segmentos da sociedade que realizam trabalho. As classes dominantes foram em grande parte poupadas da atividade física de maneira geral. A construção do ideal do “estilo de vida saudável” só recentemente incorporou a prática diária de atividade física. Isso foi efetivado principalmente através do discurso dos cardiologistas, a especialidade dominante na profissão médica. Quanto a isso, a força, como componente do condicionamento físico, não tem o mesmo status que a resistência cardio-respiratória ou que a flexibilidade na manutenção da saúde e bem-estar. Enquanto os esportes associados com a atvidade aeróbica são cada vez mais praticados pelas classes média e alta, os esportes de força permanecem sendo uma escolha dos segmentos menos privilegiados.

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Trivializando o conceito de dependência na base do preconceito

Vivemos a era das “novas adições (ou dependências)”. Inicialmente, o conceito de dependência era aplicado a álcool e outras substâncias psico-ativas. Ao longo do tempo, outras categorias de comportamentos compulsivos foram incorporadas: jogo, sexo, comida e, agora, recentemente, atividade física. Essa última categoria tem sofrido, na última década, um florido desmembramento, gerando as sub-categorias da “dismorfia muscular” e agora, este ano, “dependência de fisiculturismo”.

Eu acredito que esses desdobramentos recentes representam um abuso do conceito de dependência, beirando o ridículo. Para explorar essa hipótese, é importante revisar o próprio conceito.

Goodman (A. Goodman, Addiction: definition and implications, 1: Br J Addict. 1990 Nov;85(11):1403-8.) identificou dificuldades para operacionalizar o conceito de “dependência” ou “adição” na teoria e prática da psiquiatria por falta de consenso em sua definição. Ele propõe a adoção de um conceito segundo o qual dependência é um comportamento que pode funcionar tanto para produzir prazer como para proporcionar uma fuga de descoforto interno, num padrão caracterizado por: 1. fracasso recorrente em controlar o comportamento (impotência); 2. manutenção do comportamento a despeito das consequências negativas (“unmanageability” – descontrole, incapacidade de administrar). No mesmo ano, Miele e colaboradores publicaram um trabalho comentando a maior abrangência do conceito de dependência química no DSM-III-R e ICD-10, manuais de referência diangóstica em psiquiatria. Nesses conceitos mais amplos, a definição não requer mais tolerância e sintomas de abstinência, dando maior ênfase aos aspectos de compulsividade. Dependência e desordens compulsivas e obsessivas se tornaram assim, bastante próximas e difíceis de distinguir.

Para complicar o quadro, existe o conceito de “abuso”. “Abuso” de uma substância é o uso excessivo da mesma ou o uso da mesma para fins outros que aquele para o qual ela é destinada na medicina. Feingold e Rounsaville (Feingold A, Rounsaville B., Construct validity of the abuse-dependence distinction as measured by DSM-IV criteria for different psychoactive substances, Drug Alcohol Depend. 1995 Aug;39(2):99-109.) revisaram o emprego destes conceitos e concluiram que não há bases para uma distinção categórica entre abuso e dependência, estando os mesmos situados ao longo de um contínuum. Wideger e Smith, na mesma linha, apontam que esse é o continuum do descontrole sobre um comportamento (Widiger TA, Smith GT., Substance use disorder: abuse, dependence and dyscontrol., Addiction. 1994 Mar;89(3):267-82).

No entanto, se abuso e dependência se referem a comportamentos de descontrole sobre o uso de uma substância psico-ativa, como aplicar o conceito de dependência a comportamentos que não envolvem o uso delas? Wiesbeck e Taschner (Wiesbeck GA, Taschner KL., [Comments on the definition of so-called "new addictions"], Versicherungsmedizin. 1993 Jun 1;45(3):82-5.) comentaram a questão e apontaram alguns perigos. Para os autores, a aplicação não-crítica do conceito de dependência pode levar a uma “inflação de dependências” (provavelmente o que observamos hoje). Nesse caso, o conceito perde seu poder preditivo e se torna inútil. Alguns anos antes, Jaffe (Jaffe JH Trivializing dependence, Br J Addict. 1990 Nov;85(11):1425-7; discussion 1429-31.) alertou para o perigo da “trivialização da dependência”, atitude intelectual na qual arrancar cabelos compulsivamente e o uso diário de heroína são colocados na mesma categoria, por exemplo. Para o autor, isso levaria a uma erosão do apoio público a políticas de intervenção sobre dependência química, questão séria em saúde pública.

Aparentemente, o cerne da discussão e provavelmente o que deveria ser o critério central para a identificação de uma dependência é o fracasso nas tentativas de controle, ou seja: o indivíduo está involuntariamente comprometido com a “ativação psicotrópica” em questão (assumindo que possamos empregar o conceito de dependência fora do contexto do uso de substâncias exógenas).

O próximo passo para julgar a pertinência das “novas adições”, portanto, é explorar esse aspecto: em que medida a prática constante e de alta frequência de atividade física é involuntária? Em que medida ela foge ao controle do indivíduo e, assim, prejudica outros aspectos de sua vida emocional, física e social?

Deixo essas perguntas ao leitor para retomar, em seguida, a discussão mais específica.

é isso ae, boa leitura "iron-brothers" [roubei o termo dela hahahah]

abraços

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