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Icarusnerd

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  1. Gostei
    Icarusnerd deu reputação a AlvinhoRJ em Medicine 101   
    Olá pessoal! Seguindo os colegas lourensini e amandarun, resolvi criar um tópico do mesmo estilo, porém direcionado à medicina. Já comecei o curso há 2 anos, porém somente agora entramos no ciclo clínico. É agora, no quinto período, que segundo muitos começaremos a "aprender medicina", por isso o 101 e não um 501 ou 105 =)

    E o que medicina tem a ver? Saúde, para muitos, é o objetivo central de muitos quando procuram fazer atividade física. Porém, em alguns casos, a filosofia de "se sacrificar para vencer" é levada talvez muito ao pé da letra. Deixando as implicações morais de lado, acho interessante expor aos colegas as dificuldades de quem nem sempre é abençoado com boa saúde. Ou as dificuldades de quem simplesmente não tem possibilidade de cuidá-la tão bem quanto nós, assim como quem se sacrifica pelo trabalho, pelos filhos, ou por qualquer outra razão.

    Estamos praticando atendimento de pacientes sob a supervisão de professores. E alguns casos são bem tensos. A ideia do tópico é a postagem de alguns desses casos com o passar das semanas, com objetivo de discussão e reflexão. Nomes e lugares serão preservados (serão usados nomes fictícios). Neste período temos consultas de adultos, de pediatria, psiquiatria, oftalmologia e dermatologia.

    Como já se passaram alguns casos, vou postar os desta semana pra deixar o pessoal em dia. E com o passar das semanas vou postando mais casos interessantes.


    Caso 1
    Conceição, a tia-avó de Felipe, o trouxe pra uma consulta preocupada com a altura do menino, que aparentava ter 3 anos, porém já estava quase fazendo 6. Segundo a tia avó, a mãe do menino era dona de uma boca de fumo, usava maconha, crack, cocaína, fumava e bebia muito, inclusive durante a gravidez. Fez várias tentativas de aborto, sendo que a última tentativa culminou no nascimento do menino prematuro aos 7 meses. Quando a tia-avó visitou o menino no hospital, pediu a mãe para cuidar dele, e a mãe disse que não podia, e que preferia deixar o menino morrer. Quando a mãe chegou em casa, o pai, que também usava drogas, bateu tanto na mãe que ela teve um AVC e ficou com a metade direita do corpo paralisado. A tia-avó tinha denunciado a mãe ao conselho tutelar, e o menino, que havia ficado 2 meses no hospital (devido ao nascimento prematuro e agressões durante a gravidez), viveu o primeiro ano de vida com o conselho tutelar, até a tia-avó ganhar a guarda. Porém, durante esse primeiro ano de vida, o menino não foi amamentado, e foi dado a ele água de fubá no lugar de leite, razão pela qual ele cresceu pouquíssimo no primeiro ano de vida. Durante os cuidados da tia-avó, ele cresceu num ritmo normal, porém o atraso de crescimento não pôde ser recuperado.

    Caso 2
    Joana, mãe de Henrique, o levou ao neuropediatra preocupada com o comportamento do filho, epiléptico, extremamente agressivo. O menino, para usar palavras mais suaves, era um animal. Não deixou fazer nenhum exame físico, nem pesar, nem fazer nada. Arranhou a professora. Bateu na mãe várias vezes durante a consulta. Gritava incessantemente. A mãe tinha uma cicatriz na mão, de uma vez que o menino mordeu a mão dela. Ele já quebrou um cabo de vassoura na cabeça da irmã de 12 anos. Detalhe: ele tem 4 anos. Ele tinha pedido pra pai para matar a mãe dele, pois segundo o menino o lugar da mãe era no céu. Respondia "não" a todas as perguntas, inclusive as que não podiam ser respondidas com sim/não. Outro detalhe: durante toda a consulta ele estava sob efeito de calmante. Ele toma calmante todos os dias e é assim. A professora, neuropediatra, não conseguiu concluir a consulta. Nada resolvido.

    Caso 3
    Nesse dia atendemos Maria Amélia, uma senhora de 85 anos com um tumor enorme no rosto. Era bem maior que este:

    Ela foi pra dermatologia chorando de dor, porém não podiam fazer nada por ela lá, pois ela deveria ser encaminhada para um cirurgião de cabeça e pescoço. O problema é que a fila é enorme e a prioridade dela é baixa, pois o tumor é classificado como benigno. Pra piorar, durante a consulta, essa mesma senhora recebeu o diagnóstico de carcinoma basocelular (câncer de pele) numa mancha que ela nem dava muita atenção, e que não era motivo da consulta, mas pelo menos foi encaminhado a um cirurgião para retirada, que talvez, dependendo das condições, poderia retirar o tumor do rosto. Caso 4 Em plena quinta-feira, às 8:15 da manhã, tivemos o prazer de conhecer Dona Maria, de 50 anos, internada compulsoriamente no hospital psiquiátrico, que colaborou com uma entrevista dirigida pelo professor. Ela relatava ter "problemas de comunicação". É uma pessoa aparentemente tranquila e amigável. Só apresentava alterações de estrutura de pensamento e consciência de si própria, explico: formulava frases com laços associativos fracos entre ideias, além de aparentar ser ligeiramente paranoica. Dizia que os vizinhos sabiam de tudo que ela fazia, e disse que não gostava do vizinho do lado. Relatou já ter discutido com ele. Além disso, pensava que podia se comunicar com outras pessoas através do pensamento. Se mostrou triste por estar morando sozinha desde que o irmão foi morar em outra cidade. Disse que já tinha sido internada outras vezes, e que desta vez queria resolver seu problema logo para poder voltar pra casa. Ria às vezes, estava bem à vontade. Após a consulta descobrimos que num depoimento anterior ela havia relatado ter se comunicado com o vizinho pelo pensamento, e que o vizinho havia a ameaçado de morte. E antes da última internação ela havia invadido a casa do vizinho, quebrado tudo e esfaqueado o vizinho pelas costas, que felizmente não morreu. Essa era a razão pela qual ela estava internada ali. Observação: o diagnóstico de Dona Maria é esquizofrenia, no caso, grave. Caso 5 Sexta-feira assistimos a consulta de retorno da Sra. Helena. Ela estava anêmica desde a última consulta. O professor estava preocupado porque o exame de sangue oculto nas fezes havia estava positivo, e por isso havia pedido uma colonoscopia. Só que ela não pôde fazer o exame porque estava internada. Ela havia desmaiado na rua após sentir uma forte dor no peito, e foi levada a Santa Casa. Lá fizeram eletrocardiograma (normal), cateterismo (normal) e enzimas cardíacas (muito alterado). Provavelmente ela teve uma isquemia cardíaca. Não chegou a ter um infarto. Além disso, ela havia perdido 8kg até a última consulta, e mais 3kg entre a última consulta e hoje, sem fazer dieta. Tinha colesterol alto controlado, e fumava. Os batimentos cardíacos estavam alterados desde a última consulta. Quando questionada sobre casos de doenças de coração na família, ela relatou que o pai tinha Doença de Chagas, que achava que não tinha, mas que não tinha feito exame pra saber. Professor perguntou de onde ela era. Ela respondeu que era de Lassance. Nas palavras do professor: "Aiaiai... Não é a cidade que Carlos Chagas descobriu o bicho?". E pediu pra fazer exame pra detectar o parasita da Doença de Chagas e uma colonoscopia urgente no mesmo hospital... que foi prontamente negada pela administração do hospital devido ao tamanho da fila para realizar o exame (problemas do SUS). O professor a encaminhou a outro hospital que poderia realizar o exame, e deu o telefone de um colega que poderia realizá-lo a um preço razoável em último caso, e retorno marcado pra daqui a 1 mês. No fim da consulta ela ainda relatou que há 3 anos o próprio filho tentou matá-la com veneno de rato. Ela quase morreu. Mas infelizmente esse era o menor dos problemas, pois não havia nenhuma relação com o que ela poderia ter (tal suspeita não foi dita a ela): suspeita de Doença de Chagas e câncer de intestino. E ela também tomava antidepressivo, assim como a maioria dos pacientes que a gente está vendo... Porque não tá fácil pra ninguém... Aguardamos o retorno da Sra. Helena, que será relatado aqui.
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